Uma dúvida muito comum no mundo empresarial é sobre as responsabilidades do sócio retirante em relação aos débitos trabalhistas devidos pela entidade na qual ele participou do quadro societário.
Segundo o Mapa das Empresas no Brasil, elaborado pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), em julho de 2024 existiam 22.170.271 empresas ativas no Brasil, desse total:
- 7.006,697 são sociedades limitadas;
- 144.756 sociedades anônimas fechadas;
- 49.627 sociedades anônimas abertas;
- 39.825 sociedades em conta de participação;
- 38.402 cooperativas.
Nesse universo de mais de sete milhões e duzentos mil CNPJs nas diferentes naturezas jurídicas, são vários os motivos e as razões que fazem um sócio tomar a decisão de deixar de participar do quadro societário. Independentemente da razão, é importante que tanto aquele que sai como os que continuam na empresa fiquem cientes das obrigações do sócio retirante.
A responsabilidade do sócio retirante
Segundo o artigo 1.003 do Código Civil, o sócio retirante permanece responsável por todos os atos da empresa, inclusive responderá por dívidas com fornecedores, previdenciárias, tributárias ou trabalhistas contraídas antes da sua saída do quadro societário, por até dois anos após a sua retirada.
Quanto às dívidas trabalhistas, a Lei n° 13.467 de 2017, que alterou a Consolidação das Leis do Trabalho, inseriu no artigo 10-A da CLT que o sócio retirante responderá subsidiariamente pelas obrigações trabalhistas da sociedade relativas ao período em que ele figurou como integrante do quadro societário da empresa, somente em ações ajuizadas até dois anos depois de averbada a modificação do contrato (saída do sócio).
Tratando-se de responsabilidade subsidiária do sócio retirante, a legislação também estabelece uma ordem de preferência dos devedores que ficou assim definida:
- Primeiro: a pessoa jurídica (a empresa) tem a preferência para realizar o pagamento da dívida trabalhista;
- Segundo: os sócios atuais;
- Terceiro: os sócios retirantes.
Fica claro, na ordem de preferência dos devedores, que o sócio retirante só responderá pelas dívidas trabalhistas quando as tentativas de execução envolvendo a pessoa jurídica e os sócios atuais fracassarem.
Limitações e prazos da responsabilidade para o sócio retirante
Conforme o artigo A-10 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o sócio retirante responde subsidiariamente pelas dívidas trabalhistas contraídas pela sociedade antes da sua saída, em ações que tenham sido ajuizadas até dois anos após averbada a modificação do contrato.
Resumindo: o sócio retirante só responderá pelas dívidas trabalhistas contraídas pela empresa antes da data da sua saída do quadro societário. Porém, ele poderá ser acionado em até dois anos após o registro da alteração contratual.
Lembrando que a contagem do prazo começa na data da averbação da retirada do sócio no contrato social perante a Junta Comercial.
Portanto, se uma ação for ajuizada após os 24 meses da averbação do contrato, o sócio retirante não poderá ser acionado.
E as dívidas futuras? É importante frisar que o sócio retirante não será responsabilizado por dívidas futuras contraídas pela empresa na qual ele era sócio após a sua saída, ou melhor, depois da averbação do contrato.
Entretanto, o parágrafo único do artigo 10-A da CLT traz na sua íntegra que: todo sócio retirante responderá solidariamente com os demais quando ficar comprovada fraude na alteração societária decorrente da modificação do contrato.
Implicações para os trabalhadores e sócios remanescentes
Algumas vezes, os critérios que estabelecem as responsabilidades do sócio retirante implicam em insegurança jurídica para o trabalhador e para os sócios remanescentes.
Por exemplo, imagine uma sociedade aberta em 2015. Em 2017, um dos sócios se afastou do seu quadro societário.
Nesses dois anos, esse sócio retirante usufruiu do trabalho dos profissionais contratados e que continuaram na empresa após a sua saída. Porém, a empresa não arcava com seus deveres trabalhistas, não pagando as horas extras devidamente aos seus colaboradores.
Em 2020, um dos profissionais entra com uma ação trabalhista contra a empresa. O trabalhador ganhou a causa e a empresa precisa realizar o pagamento devido. Nesse caso, o sócio retirante não poderá ser acionado, porque já se passaram os dois anos previstos na CLT. Somente os sócios remanescentes responderão pelos atos ilícitos da empresa, apesar do sócio retirante ter usufruído dos serviços do profissional.
Processo favorável para sócias retirantes
Em julho de 2024, alguns portais de informações jurídicas, entre eles o Conjur, divulgaram o caso de duas sócias retirantes que foram consideradas não responsáveis por débitos trabalhistas da empresa na qual fizeram parte do quadro societário.
Compreenda o ocorrido: uma professora acionou a Justiça contra uma escola em que trabalhou e também o grupo econômico no qual a entidade pertence, solicitando o pagamento de verbas rescisórias e o reconhecimento do acúmulo de função, entre outras reclamações.
Ela havia sido demitida em março de 2023 e ajuizou a ação um mês depois.
A 12ª Vara do Trabalho de Campinas (São Paulo) afastou a responsabilidade das duas sócias retirantes pelos débitos trabalhistas da escola, tendo como base o artigo 10-A da CLT.
As sócias se retiraram da sociedade em abril de 2021 e, segundo o juiz, as provas indicavam que elas não tiveram participação em nada na administração posterior da escola.
Agora que ficou mais fácil compreender a responsabilidade do sócio retirante em dívidas trabalhistas, que tal continuar a leitura para saber como é feita a análise e apuração de haveres nas dissoluções societárias?