Implicações penais da reforma tributária

Em dezembro de 2023, o Congresso Nacional promulgou a emenda constitucional 132/2023, que introduziu a primeira etapa da tão esperada reforma tributária. 

A sua aprovação tem o objetivo de simplificar e facilitar todo o sistema tributário. No entanto, é considerado por unanimidade pelos legisladores, advogados tributaristas, contadores e empresários como algo complexo e disfuncional.

Nessa primeira etapa, o principal efeito da aprovação da reforma é a extinção do ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins que passam a estar inseridos no IVA (Imposto sobre Valor Agregado).

O IVA, por sua vez, é um imposto dual, ou seja, ele traz duas divisões que são o CBS e o IBS:

  • CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços): une o IPI, PIS e Cofins, juntando esses tributos federais em alíquota única. 
  • IBS (Imposto sobre Bens e Serviços): junta em uma só cobrança o ICMS e o ISS, tributos estadual e municipal que incidem sobre bens e serviços.

Com isso, as reduções da base de cálculo, isenções, crédito presumido e outros associados aos tributos que foram instintos também terminam. 

Se de um lado a reforma veio para desburocratizar os processos, de outro o seu conteúdo ainda deixa dúvidas em relação aos impactos que o empresário terá na responsabilidade penal e também na forma como os crimes tributários serão interpretados e penalizados.

Impactos da reforma tributária na responsabilidade penal de empresários

Fato é que a emenda constitucional 132/2023 traz em seu texto contradições e indefinições, além de a reforma tributária apresentar um leque de alterações e obrigações fiscais que ainda aguardam regulamentação e publicação.

E essa realidade faz surgir dúvidas e inseguranças quanto à responsabilidade penal dos empresários, até porque muitas das alterações e obrigações se tornam contraditórias considerando a Constituição Federal.

A reforma tributária, então, apesar de ser positiva para a desburocratização, pode trazer novos desafios para os empreendedores no que diz respeito à sua responsabilidade penal.

Essa unificação dos tributos traz mais transparência e eficiência na arrecadação. No entanto, isso também facilita o acesso do Ministério Público a informações fiscais, o que aumenta o risco de processos criminais para empresários que, de forma proposital ou não, cometem erros ou omissões.

A pressão para cumprir de forma rigorosa as obrigações tributárias pode ser intensificada, levando a uma maior utilização da esfera penal como uma ferramenta de arrecadação.

Simplificação tributária e os riscos na esfera penal associados a reforma tributária

A simplificação tributária proposta pela reforma tem como objetivo acabar com a complexidade do atual sistema de impostos, que é uma das principais causas de conflitos entre o governo e os contribuintes.

Mas, o contrário pode acontecer. Segundo uma pesquisa do Jornal Folha de São Paulo, apenas 12,7% dos contadores brasileiros, que estão à frente orientando os gestores sobre como adequar suas empresas para as mudanças exigidas, consideram o sistema proposto transparente e previsível.

Historicamente, a falta de clareza nas regras tributárias tem levado muitos empresários a cometerem infrações sem intenção criminosa.

E com o maior compartilhamento de informações fiscais entre a Receita Federal e o Ministério Público, somado a falhas na interpretação da nova legislação e brechas que podem ser exploradas de forma indevida, pode-se aumentar a rigorosidade em que a responsabilidade penal é aplicada.

Acordo de não persecução penal (ANPP) e sua aplicabilidade em crimes tributários

O acordo de não persecução penal (ANPP) foi introduzido pela Lei nº 13.964/22 e permite que os acusados de crimes com penas mínimas de até quatro anos evitem o processo penal mediante a admissão de culpa e o ressarcimento dos danos causados.

Esse mecanismo visa diminuir o número de processos criminais e oferecer uma alternativa mais eficaz e rápidas para a resolução de delitos menores.

No contexto de crimes tributários, a aplicação do ANPP é complexa. Muitas vezes, promotores condicionam a aceitação do acordo à quitação total do débito tributário, o que nem sempre é praticável para os empresários.

Apesar da sua potencial utilidade, a aplicação desse mecanismo em crimes tributários ainda depende de uma implementação justa e equilibrada, que leve em consideração a capacidade financeira dos acusados, assim como a gravidade do delito.

Efeitos do compartilhamento de dados fiscais sem autorização judicial

A possibilidade da Receita Federal compartilhar dados fiscais sigilosos com o Ministério Público sem a devida autorização judicial é uma questão que tem gerado controvérsias.

Esse compartilhamento é facilitado pela reforma tributária e pode aumentar consideravelmente o risco de processos criminais contra empresários, baseados em informações obtidas sem a autorização judicial.

Esse tipo de prática levanta preocupações sobre a violação de direitos constitucionais, como o direito à privacidade e ao devido processo legal.

Recentemente, algumas decisões judiciais têm anulado provas obtidas sem a autorização, o que demonstra a necessidade de haver um equilíbrio entre a fiscalização eficiente e o respeito aos direitos dos contribuintes.

Cabe a reforma tributária garantir mecanismos de controle que protejam os direitos fundamentais dos empreendedores.

Agora que você já sabe mais sobre as implicações penais da simplificação tributária, continue no nosso blog e leia PERSE: o que mudou com a MP 1.202/23?.

Hugo Zenatto

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